para Yvonne Silveira
Eu a via de longe. Parecia estar inatingível para mim. Normalmente, eu cá na plateia; e ela lá no palco. Aproximar-me dela parecia ousadia, como se uma formiga quisesse alcançar uma águia lá nas alturas. Mas houve um dia, desses que a gente não imagina, em que eu estive no palco; e ela, na plateia. E, como se a águia pousasse perto da formiguinha, após minha fala sobre uma obra literária, ela veio até mim e me parabenizou. Ela veio até mim...
Foi assim, sem esperar, mas desejando, que Yvonne Silveira me aproximou. Não, ela não era inatingível, não era uma deusa, ela é um ser humano, tão humano me fez sentir. Conversamos sobre Camões, e foi como se eu estivesse ouvindo, através de sua suave voz, a poesia de uma vida inteira. Sim, depois desse dia, sempre quando a vida me presenteava com a sua presença, eu me achegava para dizer um “oi!”. Em um desses encontros, ela me disse, com tanta poesia, “vamos encenar Inês de Castro? Você vai ser o Pedro!”. Tão singelo convite, como não aceitar. Só falta agora esse teatro se realizar.
No ano em que o Brasil perdeu o poeta dos Anjos, a poesia Yvonne teve seu primeiro verso traçado no fim daquele dezembro. A nossa Princesa ainda era uma menina, e a infanta Yvonne viu e sentiu o seu crescimento. Levantou muita poeira na hoje Praça da Matriz e Praça Doutor Carlos. Dançou muitos reinados com Caboclinhos, Marujada e Catopês. Nos canteiros, colheu flores e frutos; nas ruas e quintais, brincadeiras de um tempo que não volta mais. Época em que a vida seguia o tempo do sol e da lua, das prosas das calçadas, das histórias contadas à noite. Uma Montes Claros centenária...
Não fui seu aluno, mas imagino como seria se fosse seu aluno. Muitas de minhas professoras tiveram essa alegria que eu só a posso ter através de seus livros, pois seus ensinamentos de mestra das letras estão em suas palavras deixadas escritas nas páginas de uma história.
Que a vida me permita cantar essa amiga com a poesia que ela merece. E, seguindo o seu exemplo, possa eu também me aproximar de todos ao meu redor. Seja o seu olhar o guia de muitas pupilas que enxergam sem ver. Assim como eu, que continuo a formiguinha, mas almejando à sua visão de menina-mulher, de montes-clarense, de professora, de poeta, de história, de vida. Yvonne Silveira, a águia das Letras, que a muitos os ensina a ser.
In: COTRIM, Dário Teixeira (Org.). A deusa das letras. Vol. II. Montes Claros: Editoras Millennium/Cotrim Ltda, 2014. (Antologia)