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Márcio Moraes
no leito solidário de uma floresta altiva descansem por favor a minha poesia
Textos

TORRES, Wagner. Terral. Belo Horizonte: Plurarts, 2007.


Terral

  

Nas mãos de um escritor genuinamente negro e defensor de sua raça, há uma caneta de tinta preta que traça a história afra nestas terras brasileiras. A brisa marítima que chega a terra traz consigo os construtores da riqueza nacional, desta riqueza Terral. Como em uma Cavalgada das Valquírias, este Wagner, construtor de Torres onde gritam os quilombolas, dá o tom penetrante e explosivo de seus poemas políticos, sociais e reflexivos.

Assim, mostra-nos a Coragem que existe em nossos poros que são porões, mas que deixamos abandonada e sem proveito como um rio seco: histórias que não tiveram tempo de acabar, ensinamentos que não tiveram tempo de iniciar. Resta, então, recorrer à palavra tocaia capaz de dar o bote aos atentos e desatentos, remetendo há tempos que não voltam mais. Entretanto, com a escrita, podemos ir a lugares longínquos no mapa do tempo e reviver tenras lembranças. As épocas das vanguardas que são guardadas como guardas na memória são revitalizadas através de nossa condição luterária, pois as vanguardas rompem como Lutero e representam a nossa luta contra o convencional.

Nesta nossa terra, além das pegadas da negritude, possuímos também a dádiva de termos sido merecedores de um escritor mais magno que qualquer rosa. Um sertanista que nos ensinou a travessia do mundo e que, como registrou o Torres, não há nada Mais Maior de Grande que a vida em que vivemos. Viva o Rosa!

Como somos humanos dotados de sexualidade e de instintos aguçados, modulam-se os corpos em canções de som Acústico: a carne se torna nua e crua e de braços abertos vou regendo o mangue de teu solo. E que macio e desejado é este mangue e solo! Um terreno humano ansioso por germinar sementes humanas, pois a terra é o nosso berço, e é justamente isso que nos diz o Terral!

Nos versos de Wagner Torres, percebemos a sua intensa preocupação com as questões sociais. Críticas, ironias feitas, sobretudo com jogos de palavras, mostram a potencialidade dos vocábulos. As paráfrases também muito utilizadas permitem-nos navegar nos mares desconhecidos e conhecidos deste escritor belo-horizontino. Em Admirável Mundo Novo, Aldous Huxley, na década de trinta, pressagiou muitas tecnologias que hoje experimentamos. Mas na sua simplicidade, Torres nos mostra um Admirável Mundo Gordo em que a injustiça social se faz presente tão assustadoramente. E que apesar de existir Juiz, o que há é preJuizo. A ganância e o desejo desenvolvimentista representada por Brasília é um mistério ministério. Então, maldito seja quem mudou o curso dos rios. A gula de falsos líderes, as mortes em prol de um proveito, de um poder, as guerras nos quintais, o mar: refúgio dos corpos levados pelo vento. E nas grandes capitais, a Guerra Urbana em que a milícia desinforma(da)tizada se abate no morro e a parte uniformizada cria uma exceção de cinema. E bombardeados pelas telas de corrupções e crueldades, pedimos todos para sair, porque a nossa estratégia, do grego strategía, nesta Terra é sobreviver. Logo, pensemos no Anúncio I: O poeta (se) (adverte) o governo é prejudicial. À saúde. Resta-nos, dessa forma, viver os obstáculos da vida e observar o crescimento da pobreza, das falsas ideologias, Ideologicamente Inconsistente. Até quando? Estudos acontecem, debates se afloram, crônica da vida, mas a fome não pode esperar!

Vale ressaltar que Wagner homenageia em seus versos artistas renomados como Milton Nascimento, Torquato Neto e sua Tropicália, lembranças de poetas marginais, e artistas mais locais como Igor Xavier, o bailarino montes-clarense assassinado, vítima da homofobia. E aos corações ressalta: tudo se perde menos a emoção!

Versos que devem ser lidos com um olhar nada ingênuo, pois em cada linha vislumbramos a intenção crítica e reflexiva do autor. Após a leitura de Terral, ratificaremos a idéia de que nossos negros, sobretudo, os pobres ainda são estigmatizados. E não podemos negar a nossa raça, por isso não digamos “negão”, mas negrão! A Escravidão está presente até hoje: dizem que Deus é branco; Dizem que não cultuamos a beleza pois seu significado é uma carta de alforria.


Resenha publicada no jornal “O Norte”, dia 5 de março de 2009.

Márcio Adriano Moraes
Enviado por Márcio Adriano Moraes em 27/12/2014
Alterado em 26/01/2024
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